EL PAÍS, 19 FEV 2018
O debate sobre a China nas capitais no Ocidente está passando por uma transformação sem precedentes. Os otimistas com as consequências da ascensão da China — os chamados panda huggers, que dominaram o debate público desde a década de 1990 — estão perdendo espaço para os China hawks, para os quais o Ocidente precisa adotar uma estratégia de defesa muito mais dura contra a crescente influência chinesa.
Duas publicações recentes simbolizam essa mudança. Na Alemanha, o relatório Authoritarian Advance: Responding to China’s Growing Political Influence in Europe ("Avanço Autoritário: Respondendo à Influência Política Crescente da China na Europa", em tradução livre), publicado pela MERICS e pela GPPi, dois importantes think tanks em Berlim, argumenta que as tentativas de Pequim de influenciar a política europeia e a promoção dos ideais autoritários chineses "representam um desafio significativo para a democracia liberal, bem como os valores e interesses da Europa".
Nos Estados Unidos, Kurt Campbell e Ely Ratner, dois ex-diplomatas de alto escalão, publicaram na revista Foreign Affairs o artigo The China Reckoning: How Beijing Defied American Expectations ("Fazendo um balanço: como Pequim desafiou as expectativas dos EUA", em tradução livre). Nele, os autores argumentam que a política dos EUA em relação à China desde a Segunda Guerra Mundial foi irremediavelmente ingênua e que Pequim acabou levando vantagem sobre Washington.
Na Austrália, o governo endureceu as regras para investimentos estrangeiros em terras agrícolas e infraestrutura energética, em resposta à crescente influência econômica chinesa e à divulgação de dados sobre doações eleitorais de empresários ligados ao governo chinês antes das eleições em 2016. Em um gesto dramático, o primeiro-ministro australiano criticou a China (o maior parceiro comercial da Austrália e o maior investidor no país) por sua interferência. Na televisão australiana, invocou, em mandarim, um famoso slogan chinês associado a Mao Tse Tung para declarar que o povo australiano "se levantará" contra a intromissão em seus assuntos domésticos. Veremos discursos e medidas parecidas de governos no Ocidente ao longo dos próximos anos, como o banimento de financiamento político estrangeiro, aumento do monitoramento de investimentos chineses (sobretudo em áreas sensíveis, como infraestrutura e mídia), e maior ênfase em cibersegurança para evitar ingerência externa, como visto nos Estados Unidos durante as eleições de 2016.
O crescente papel econômico da China também é uma realidade irrefutável no Brasil. Dependemos cada vez mais da demanda chinesa de commodities, e a China em breve se tornará o maior investidor no Brasil, dando-lhe influência econômica e política sem precedentes.
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